sábado, 17 de dezembro de 2016

Aprenda a fazer uma guirlanda reciclando um livro

Assista o vídeo da Cristina Verluis e aprenda a reaproveitar um livro fazendo uma guirlanda de natal para enfeitar a sua casa:

fonte: Cristina Verluis

Seção Resenha de Livros: VIDEIRAS DE CRISTAL

Olá.
Aqui é o Rafael novamente, em nova colaboração para o blog da Biblioteca Pública.
Hoje, volto a falar de livro. Conforme prometido há postagens atrás, voltamos a falar da Revolta dos Mucker (1868 – 1874), o movimento messiânico ocorrido em uma área de imigração alemã do Rio Grande do Sul. Voltamos a evocar a figura de Jacobina Maurer, usando para isso seu relato romanceado mais famoso.
Hoje, então, falo do romance VIDEIRAS DE CRISTAL, de Luiz Antônio de Assis Brasil.

ASPECTO FÍSICO
Bem. Há algum tempo atrás, falei a respeito do escritor gaúcho Luiz Antônio de Assis Brasil. Escritor, professor universitário, músico, com seus romances focando principalmente o passado do Rio Grande do Sul, Luiz Antônio de Assis Brasil é aclamado pela crítica, premiado, e teve livros seus adaptados para o cinema.
Já resenhei um livro dele, Cães da Província – para mais informações a respeito do escritor, acessem a postagem referente. Agora, falo a respeito de VIDEIRAS DE CRISTAL, que contribuiu não apenas para sua fama nacional, como também para lançar uma nova luz sobre o movimento mucker.
VIDEIRAS DE CRISTAL foi publicado pela primeira vez em 1990. A sua primeira edição foi pela editora Mercado Aberto (a capa acima é da 5ª edição, de 1997). Quem for ler, antes de tudo se preparem: o volume tem 544 páginas, sem contar capa.
Em 2002, VIDEIRAS DE CRISTAL ganhou uma adaptação para cinema: o diretor Fábio Barreto transpôs o romance para as telas sob o nome A Paixão de Jacobina. Assim, há uma edição do romance com capa especial referente ao filme, pela mesma editora Mercado Aberto. A edição mais recente do romance foi lançada em 2010, pela editora L&PM, atual editora da obra do autor, com 496 páginas (veja capas mais adiante).
O romance já foi bastante analisado em artigos de revistas literárias e trabalhos universitários – eu mesmo, na fase de pesquisa para esta postagem, encontrei uma porção desses trabalhos disponíveis na internet.
Do filme, falamos em outra ocasião. Vejamos primeiro o romance.

ASPECTO HISTÓRICO
Da Revolta dos Mucker – descobri recentemente que o correto para se referir ao movimento seria Revolta “dos Mucker”, e não “dos Muckers” pois o termo alemão é usado sem o “s” tanto no singular quanto no plural – já falei em duas ocasiões: quando resenhei o livro Os Fanáticos de Jacobina, de Fidélis Dalcin Barbosa, e quando resenhei o filme Os Mucker, de 1978, primeira produção artística focando o episódio que, durante muito tempo, foi um tabu para os descendentes de imigrantes alemães estabelecidos em Sapiranga, a “cidade das rosas”, que na época pertencia ao município de São Leopoldo.
Mas vamos recordar rapidamente: o movimento mucker – termo alemão que, em diversas obras, foi traduzido como “hipócrita”, “fanático”, “falso santo” – foi um movimento messiânico (conflito social que gira em torno dos seguidores de um profeta ou pessoa que afirma ser santa, tal como foi a Revolta de Canudos): uma leva de colonos alemães estabelecidos na região de Padre Eterno, na base do Morro do Ferrabraz, em Sapiranga, reuniu-se em torno da figura de Jacobina Maurer, uma mulher de aspecto frágil e, segundo alguns, com indícios de doença mental, que se dizia encarnação de Jesus Cristo, fazia previsões sobre o fim do mundo e confortava as pessoas injustiçadas. Em torno dela e de seu marido, João José Maurer, que já tinha fama na região como curandeiro, formou-se uma nova “religião”, baseada em preceitos que iam contra as regras do cristianismo e do protestantismo (vários imigrantes alemães eram luteranos, e essa corrente cristã era tolerada pelo Império Brasileiro, oficialmente católico, desde que seus adeptos não se reunissem em templos). Há quem enxergue no movimento à casa dos Maurer um ingrediente de protesto contra a intransigência das autoridades – muitos colonos sentiam-se abandonados pelo poder público da época.
Muita gente começou a se juntar à seita. Os que se opunham, os “ímpios”, começaram a espalhar boatos sobre o que realmente acontecia nas reuniões na casa dos Maurer e a açular as autoridades locais contra os chamados mucker. João e Jacobina chegaram a ser presos e conduzidos a São Leopoldo e a Porto Alegre algumas vezes. Os mucker já chegaram a enviar um ofício ao Imperador Pedro II pedindo proteção contra as perseguições das autoridades policiais.
O auge do conflito se deu quando, após muitas provocações por parte dos “ímpios”, os mucker, supostamente a mando de Jacobina, em 1872, começaram a estocar armas, matar e incendiar casas de colonos. Essa perturbação na paz da região foi o suficiente para as autoridades chamarem o Exército Imperial para caçar os mucker.
E foram necessárias três expedições para eliminar o foco principal da seita, ou seja, Jacobina Maurer – a ação do exército imperial foi dificultada pelo terreno conhecido do inimigo. Em uma das investidas, o comandante do exército imperial, coronel Genuíno Sampaio, veterano da Guerra do Paraguai e de outras guerras ocorridas no Brasil, consegue destruir o “templo” dos muckers, porém Jacobina e seguidores conseguiram escapar – e o Coronel Sampaio ainda morreu devido a complicações de um tiro recebido acidentalmente na perna. O cerco final foi no dia 2 de agosto, quando, sob o comando do capitão Francisco Santiago Dantas, o exército, graças à ajuda de um ex-membro da seita, elimina Jacobina e vários seguidores refugiados no mato do Ferrabraz. João Maurer foi encontrado morto tempos depois, supostamente suicidado, e seguidores remanescentes dos mucker foram perseguidos até a virada do século XIX para o XX.
Por muito tempo, os descendentes de personagens da história evitavam falar do assunto, mas, hoje, o movimento mucker rende alguns dividendos para Sapiranga, que hoje promove roteiros turísticos nos locais da tragédia. Por algum tempo, a cruz de madeira que marcava o suposto local onde Jacobina foi morta, erguida no início do século XX, ficou abandonada e até caiu, roída por cupins e bicada por pica-paus, mas uma nova foi erguida, e integra, junto com o monumento em homenagem ao Coronel Sampaio, o roteiro turístico chamado Caminhos de Jacobina.
Bem, é o básico para refrescar a memória dos leitores, porque, fora os artifícios literários usados por Assis Brasil, a história de VIDEIRAS DE CRISTAL é praticamente essa: toda a história do movimento mucker. Mas calma.

ASPECTO LITERÁRIO
VIDEIRAS DE CRISTAL – O ROMANCE DOS MUCKERS, seu subtítulo, compõe-se de diversas histórias correndo em paralelo à história principal. Como literato, construindo seu romance a partir de fato histórico, Luiz Antônio de Assis Brasil admite, parafraseando suas palavras no posfácio da obra, que não tinha muito compromisso com a realidade. Logo, sua versão do conflito dos mucker lança mão de recursos de realidade e de ficção. Desde já se sabe que os fatos históricos podem não ter ocorrido da maneira como foi narrada pelo autor, muito embora ele tenha feito a devida pesquisa para elaborar o romance.
Assis Brasil procurou falar do movimento mucker pelos dois lados: o dos seguidores de Jacobina, e o do lado dos “ímpios”, sem dar certezas de qual lado é o dos “mocinhos”, e de qual é o dos “bandidos”.
Há, claro, a certeza de que o movimento mucker foi uma resposta ao meio social desumano, de autoridades prepotentes e injustiças sociais, os mucker lutando pela única coisa que no momento lhes restava: a fé. Pelo menos, é assim na primeira metade do romance. Na segunda metade, os mucker é que se tornam os “bandidos” da história, quando passam eles mesmos a perseguirem os “ímpios”.
O título do romance faz referência a uma passagem bíblica que compara a alma humana a videiras de cristal: “fecunda nos verões luminosos mas quebradiça quando coberta pela geada do inverno”, uma referência à credulidade do ser humano, e de como tal credulidade às vezes o leva a cometer delitos contra pessoas. Parece que é isso.
A história de VIDEIRAS DE CRISTAL começa na Alemanha, em um vilarejo onde vive o abonado Hans Willibald, que tem por hobby colecionar cactos, mantidos em uma estufa – e isso, apesar de fazer tempo frio na região onde reside, e os cactos serem, antes de tudo, plantas tropicais. Hans passou parte da vida criando um sobrinho órfão, Christian Fischer, e lhe desejava um grande futuro como médico, tanto que custeou sua faculdade de medicina. Mas mal entendeu os motivos porque seu sobrinho resolveu se especializar em psicologia, uma área nova da ciência médica, e os de ele ter escolhido vir ao Brasil para montar seu consultório. Mas o Sr. Willibald autoriza a viagem, em troca de o sobrinho remeter, regularmente, amostras de cactos brasileiros (em princípio, as aparições de Willibald e sua estufa de cactos na trama serve apenas como uma “muleta” no romance, mas há um significado escondido na permanência desse núcleo).
Christian Fischer monta seu consultório em São Leopoldo. Em vários trechos do romance, Christian Fischer, personagem fictício, remete cartas – e os cactos – ao tio, descrevendo os costumes de pessoas da sociedade local e também os acontecimentos da perseguição aos mucker, entremeando alguns capítulos (aliás, não fica nítida a divisão dos capítulos do livro, que não são numerados, são divididos em cenas, em narração contínua como o roteiro de um filme – os grandes espaços em branco é que servem de limite entre as cenas do livro). Em certo momento, instado por um de seus pacientes, Jacó Fuchs, Christian acaba se juntando aos mucker, e lutando ao lado deles.
Jacó Fuchs, ou Jacó-Mula, é um dos personagens mais simpáticos do romance – e esse existiu mesmo! Tido como louco, ou simplesmente idiota, pela família e pelos amigos, e por isso não era levado a sério, Jacó-Mula encontra conforto e compreensão ao se juntar à seita de Jacobina. E segue a mulher cegamente, a ponto de abandonar a mulher e os filhos – decisão da qual se arrepende mais tarde. O homem cria uma cumplicidade com o médico Christian Fischer, a ponto de fazê-lo se juntar aos mucker – e também de arranjar alguns cactos para ele.
Do lado mucker, ainda temos, como personagens principais: Elizabeth Carolina Mentz, cunhada de Jacobina, que carrega em boa parte do livro um enorme sentimento de culpa – ela secretamente trai o marido, Henrique Mentz, com o inspetor de polícia João Lehn, caso que é descoberto pelo cunhado João Maurer, e a culpa acompanha a mulher até seu trágico fim; Ana Maria Hoffstätter, a criada de Jacobina, que acaba brigada com a própria família por conta de suas opções – e ela sofre bastante ao longo do romance, de estupro por bandoleiros até a perda de um amor secreto, morto por membros dos mucker por ter traído a seita; Rodolfo Sehn, suposto amante da Mutter Jacobina, e que se torna seu segundo “esposo” (um momento: segundo Fidélis Barbosa, o segundo esposo de Jacobina foi João Klein! Qual versão está certa?); o violento Robinson, o Ruivo; e o pastor Klein, que se junta à seita após ter perdido o cargo de pastor luterano para Wilhelm Boeber, o que o deixa rancoroso.
Por sua vez, Jacobina Maurer, a Mutter, é retratada no romance como convicta de ser mesmo uma representante do “Espírito Natural” na Terra – nesse ponto, as descrições alternam realidade e supostas visões divinas. O papel de Jacobina oscila entre o de mulher caridosa, que acolhe seus fieis como filhos, e o de mulher de fé, intransigente com as perseguições dos “ímpios”, alternando momentos de lucidez e surtos de sono letárgico. Ela chega a “santificar” sua filha de colo, Leidard, a “filha da Fé”.
Seu marido, João Maurer, anteriormente chamado de Wunderdoktor (Doutor Maravilhoso), anteriormente tinha fama como curandeiro, enquanto sua esposa Jacobina apenas o auxiliava na cura dos doentes e lendo a Bíblia aos fieis; porém, à medida que a importância de Jacobina cresce, o Wunderdoktor passa a perder importância, a ponto de praticamente “sumir” na trama – ele mesmo acaba reconhecendo sua inferioridade.
Do lado dos “ímpios”, temos: o pastor Boeber, que além da franca oposição aos mucker, passa boa parte do romance cuidando de uma maquete de madeira de uma catedral, cujo aspecto é tão simbólico quanto a trama dos cactos de Christian Fischer; o policial João Lehn, arrogante e violento, a paixão secreta de Elizabeth Carolina; o também violento delegado de polícia Schreiner, responsável pelas primeiras perseguições aos mucker; os ex-fiéis Carlos Brenner e Martinho Kassel, que acabam se tornando vítimas da fúria dos seguidores de Jacobina; os militares Genuíno Sampaio e San Tiago Dantas, os líderes da investida final contra os mucker – o primeiro, com um caráter mais violento e duvidoso, o segundo mais ponderado; e o padre Mathias Münsch, católico, cujas convicções e fé são abalados no decorrer da história, até ser vitimado pelas circunstâncias.
Há, no livro, dois capítulos que se passam no Rio de Janeiro, na corte imperial, quando uma comissão de mucker vai pedir proteção junto ao Imperador contra os abusos das autoridades policiais.
Enquanto correm essas histórias paralelas, correm linearmente os acontecimentos referentes aos mucker, conforme relatado anteriormente, então, nem é preciso nos darmos ao trabalho de recontar a história. Claro que o leitor lê VIDEIRAS DE CRISTAL já sabendo como a história termina, mas o que sustenta a narrativa é o estilo vigoroso de Assis Brasil, com as histórias em paralelo, as descrições ricas em detalhes, inclusive nas cenas de extrema violência, uma linguagem que evita ao máximo a extrema erudição que pode afastar leitores de obras desse feitio, e a capacidade de sensibilizar o leitor – está claro que, se os mucker se tornaram violentos, foi uma resposta à violência e à intolerância que eles próprios sofreram. E como não se sensibilizar com, por exemplo, o drama de Elizabeth Carolina, e com o triste fim do Padre Münsch, depois de acolher um deficiente mental que começa a carregar de um lado para outro após a morte dos familiares deste?
Estudiosos apontam, entretanto, que Assis Brasil assumiu o ponto de vista dos “vencedores” em sua narrativa, ou melhor, dos autores que retrataram, em seus estudos, os mucker como fanáticos e violentos, chefiados por um médico charlatão e por uma mulher louca e analfabeta, sem o elemento de denúncia social. Um dos primeiros autores a tratar do movimento mucker foi a padre Ambrósio Schupp, em livro redigido em alemão de cerca de 1900 – que serviu de base tanto para Assis Brasil como para Fidélis Barbosa. Atualmente, a visão de Schupp é contestada pelos historiadores, sobretudo os marxistas.
De todo modo, VIDEIRAS DE CRISTAL firma Luiz Antônio de Assis Brasil como um dos maiores escritores gaúchos, um mestre em retratar o passado gaúcho com ficção. VIDEIRAS DE CRISTAL mostra um autor em plena maturidade artística. Tudo bem que o romance tem mais de 500 páginas, mas garante horas de entretenimento ao leitor que desejar um pouco mais de cultura em sua cabeça. Ah: a edição da Mercado Aberto inclui ainda ilustrações – gravuras do século XIX mostrando os cenários da história, e um mapa da região conflagrada.
Em breve, falamos de seu produto derivado, o filme A Paixão de Jacobina.

Esta postagem é uma versão revista e com alterações do texto publicado anteriormente no blog Estúdio Rafelipe (https://estudiorafelipe.blogspot.com.br/). Aproveitem e conheçam.
Este livro, assim como outros de Luiz Antônio de Assis Brasil, se encontra disponível no acervo da Biblioteca Pública Theobaldo Paim Borges. Em caso de dúvida, pergunte a uma das bibliotecárias, elas podem auxiliar.
Em breve, nova resenha de livros aos leitores, tanto de Vacaria quanto de outras localidades alcançadas pela internet.

Até mais!

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Clima de Natal

A dica de hoje é da Paola, no Canal Fuxicos Literários:



Fonte: Canal Fuxicos Literários - Paola Aleksandra

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Resenha de filmes: OS MUCKER

Olá.
Aqui é o Rafael Grasel novamente, em mais uma colaboração para o blog da Biblioteca Pública.
Hoje, o blog trará uma novidade: vamos falar de filmes. De vez em quando, iremos trazer resenhas de filmes que tenham relação com a literatura, sejam adaptações de obras literárias ou que tenham apenas alguma relação com temas anteriormente tratados.
O filme escolhido de hoje tem apenas relação com um livro anteriormente resenhado – é um filme de fundo histórico.
Na última postagem, resenhei um livro de Fidélis Dalcin Barbosa, Os Fanáticos de Jacobina, que tratava a respeito da Revolta dos Muckers de Sapiranga, RS (1868 – 1874). Quando falei desse livro, citei que haviam sido produzidos dois filmes sobre esse episódio histórico, que por muito tempo havia sido um tabu da história do Rio Grande do Sul.
Sim, hoje vou falar de um desses filmes. Começo logo pelo primeiro, OS MUCKER, de 1978.

O FILME EM SI
Well. OS MUCKER – O MASSACRE DA SEITA DO FERRABRAZ (Jakobine, na versão internacional) foi a primeira produção cinematográfica a respeito da Revolta dos Muckers. Produção conjunta entre Brasil e Alemanha Ocidental (lembrem-se: nos anos 1970, a Alemanha era dividida em duas, por conta da Guerra Fria entre EUA e URSS). Com produção do Estúdio Stopfilm, distribuição da Embrafilme. Dirigida pelo brasileiro Jorge Bodanzky e pelo alemão Wolf Gauer (este último é o autor, também, do roteiro, enquanto Bodanzky cuidou também da câmera).
O filme é ambientado no Brasil, e foi gravado no estado de São Paulo (pelo que descobri em pesquisas) em paisagens que procuram imitar as do Rio Grande do Sul, mas boa parte dos diálogos é em hunsrückisch, um dialeto germânico comum entre os descendentes de alemães. Há trechos de diálogos em português, mas é o alemão, o tal hunsrückisch, que domina boa parte do filme (com legendas, claro).
Algo que contribui substancialmente para a veracidade do drama de 105 minutos é o fato de boa parte de seus elenco ser de descendentes de muckers, que não eram atores profissionais. O filme foi bastante premiado em sua época: recebeu os troféus Kikito de Melhor Atriz (para a atriz principal, Marlise Saueressig), Melhor Direção e Melhor Cenografia (para Dorlai Schumacher) do Festival de Cinema de Gramado, RS, em 1979, e os prêmios de Melhor Filme e Melhor Direção do Prêmio Air France, RJ, no mesmo ano.
Para melhor tratar a respeito do filme e de opiniões a respeito, faço uso das palavras da jornalista Gabriela Soutello, de um artigo publicado na época em que o diretor Wolf Gauer veio ao Brasil, em agosto de 2015. A matéria foi extraída do site Uol Notícias – link: http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/deutschewelle/2015/08/19/para-diretor-tematica-religiosa-do-filme-os-mucker-segue-atual.htm

Para diretor, temática religiosa do filme "Os Mucker" segue atual

Gabriela Soutello
19/08/2015 – 14h45
Fundamentalismo religioso continua presente na sociedade brasileira, afirma cineasta alemão Wolf Gauer, que participou em São Paulo de um debate sobre o seu filme que narra a história da seita religiosa gaúcha.
Por volta de 1824 chegavam ao sul do Brasil os primeiros imigrantes da Alemanha, em fuga principalmente da pobreza e movidos pela esperança de uma vida melhor. Cinquenta anos depois, um novo grupo de alemães desembarcava na mesma região, mas com maior dificuldade para se estabelecer: as melhores terras do Vale do Rio do Sinos, no interior do Rio Grande do Sul, já estavam ocupadas.
O filme Os Mucker, co-produção de 1978 do diretor alemão Wolf Gauer com o brasileiro Jorge Bodanzky, foi exibido (...) na Cia Paidéia de Teatro, em Santo Amaro, zona sul de São Paulo. A exibição foi seguida de um debate entre o público e Gauer.
A obra narra a trajetória de um grupo socialmente isolado, que não usava dinheiro em suas trocas comerciais e cujos membros não bebiam nem fumavam. No sectarismo e no fundamentalismo religioso, eles encontraram uma resposta à necessidade de sobreviver em condições miseráveis.
O grupo é liderado por Jacobina Mentz, considerada pelos seguidores como uma nova Jesus Cristo, e seu marido, João Jorge Maurer, curandeiro. Jacobina, além de um gênio forte, tinha epilepsia, "desde os tempos antigos vista como predestinação divina", como afirma Gauer, e não demorou a se tornar "porta-voz e líder dos menos afortunados".

Temática contemporânea
Acusados de feitiçaria e rechaçados pela comunidade da região, os seguidores de Jacobina foram exterminados pelo poder estatal. "Quem era diferente logo era considerado bruxo, feiticeiro ou criminoso, principalmente pelas igrejas tradicionais", comenta Gauer. "O filme tenta explicar a origem da violência entre grupos sociais, mesmo sendo esses grupos quase homogêneos e de caráter religioso."
Ainda que Os Mucker se passe no século 18, alguns aspectos abordados no filme permanecem atuais. "Jacobina recorreu ao pensamento religioso porque não tinha outro modelo de pensar", afirma Gauer. "Existem processos parecidos na atualidade brasileira, como o afluxo de pessoas pobres a seitas religiosas e a autodenominadas 'igrejas', que prometem resolver com 'milagres' os problemas dos que aderem. Há um fundamentalismo generalizado", diz.
O diretor explica que o filme tem falas em alemão e em português, de acordo com a língua nativa dos que participaram da produção. "Muitos descendentes dos Mucker, e que não eram atores profissionais, trabalharam no filme", diz Gauer.
"Até o surgimento do filme, a história dos Mucker era vista como uma 'mancha negra' do Rio Grande do Sul. Depois dele, alguns atores declararam se sentir 'absolvidos' do trauma de serem descendentes de supostos criminosos", afirma.
Sobre a coprodução de filmes com Bodanzky - Gauer no roteiro e o brasileiro na câmera -, que começou com filmes educativos na Alemanha, o diretor alemão afirma que foi o interesse social que inspirou os trabalhos. "Trata-se da abordagem de processos e conflitos dentro da sociedade que não são explicados pela mídia. E com a prerrogativa de sempre trazer a participação da população envolvida com a história de cada filme."
(...)

VOLTANDO ÀS MINHAS PRÓPRIAS PALAVRAS
Bueno. A matéria transcrita já disse várias coisas a respeito de OS MUCKER: sinopse, direção, algumas curiosidades dos bastidores, as opiniões de Wolf Gauer comparando a época atual e a da produção do filme. Acho que nem vou me dar ao trabalho de rememorar o que foi a Revolta dos Muckers, quem foi Jacobina Maurer, os resultados. Comparando com o citado livro de Fidélis Barbosa, publicado alguns anos antes do filme (em forma de folhetim para o jornal Correio Riograndense, de Caxias do Sul, em 1970, em livro em 1976), podemos em princípio dizer que OS MUCKER é fiel aos fatos históricos. O filme busca deixar claro que o messianismo em torno da figura de Jacobina Maurer é uma resposta ao abandono por parte do Poder Público da época, mas sem deixar claro quem eram os “mocinhos” e quem eram os “vilões” da história.
Jacobina Maurer é interpretada pela atriz Marlise Saueressig. No elenco, ainda constam os nomes dos brasileiros Paulo César Pereio, como o Capitão da Polícia, e José Lewgoy, como o Juiz Abílio – ambos envolvidos no conflito do lado oposto aos muckers.
Bem. Para começar, a cenografia capta bem a paisagem do local das filmagens, passando ao espectador a ideia do isolamento aos quais os colonos alemães se encontravam, em seu trabalho na terra, no Morro do Ferrabraz, o matagal cercando as casas, boa parte com as tábuas lascadas, algumas construções de alvenaria. Esse isolamento é reforçado pelo fato de o filme não ter trilha sonora de fundo. Algumas músicas são tocadas e/ou entoadas pelos atores, mas o filme é praticamente silencioso: apenas os diálogos e os sons do ambiente em redor – cantos de pássaros e de grilos. Mas algumas cópias possuem problemas na parte do som, que não está sincronizado às falas dos atores, e mesmo os efeitos sonoros tem problemas: dá para notar que os sons dos disparos das armas são falsos. A ideia é recriar, sim, o ambiente do século XIX dos pontos isolados do Rio Grande do Sul. Claro que no estado de São Paulo...
O enredo do filme se desenrola lentamente, sem muita pressa. O recorte de tempo escolhido foi o ano final da Revolta, 1874. Somos apresentados ao contexto da época, etc.
Quase tudo o que diz respeito aos muckers é tratado no filme: as reuniões conduzidas por Jacobina Maurer – e alguns de seus fiéis a tratando como encarnação de Jesus Cristo; o caráter ambíguo da personagem – incitando o desrespeito às autoridades da época e a perseguição aos opositores da seita, e até “deitando-se” com fiéis no campo – bem como as opiniões ambíguas a respeito dela, gente que crê na suposta santa, e gente que vê nela uma embusteira, sendo algumas oposições ocorrendo dentro de famílias; as primeiras perseguições policiais aos muckers, incluindo a vez em que Jacobina acaba conduzida de carroça para São Leopoldo, em uma de suas crises de sono letárgico, com colchão e tudo – quando ela acorda, em frente à Prefeitura, sob a cantoria do séquito que a acompanha, ela faz um discurso contra as autoridades, diante do prefeito de São Leopoldo (Tito Lívio) e do Juiz Abílio, antes de deitar de novo; a preparação, pelos muckers, de um memorial para o Imperador do Brasil pedindo proteção à seita; o armamento dos muckers por recomendação de Jacobina, os conflitos com a polícia, e os consequentes ataques dos muckers às famílias de colonos opositores, pondo fogo em residências e matando as famílias a tiros e coronhadas; o refúgio dos muckers em um matagal; e o conflito final no morro entre os muckers e o exército, onde Jacobina e vários seguidores acabam perecendo. Já a atuação de João Maurer, marido de Jacobina, no início da formação da seita, é mais citado por alto do que mostrado – o foco do filme acaba sendo Jacobina.
Em paralelo à história de Jacobina, são contadas outras histórias. Uma delas é a do velho Pedro Hauber (Abdon Schnorr), que, no início do filme, acaba tendo os bens apreendidos por determinação judicial, incluindo o filho Georg (Romeu Schutz). Membro da seita mucker, Hauber, mais tarde, é encontrado enforcado no mato – as pessoas que encontram seu corpo creem que ele fora vítima de feitiçaria por parte de Jacobina, que seu suicídio foi induzido.
Outra história que corre em paralelo é a do jovem Wilhelm Golzer (Marcus Schimidt), filho do deputado Golzer (Fritz Hill). Ele é instado pelo pai para viajar para a Alemanha fazer compras para a colônia. Wilhelm tem uma relação amorosa com uma colona, Maria Sehn (Carla Saueressig) – e ambos tem seus diálogos em português. Em um primeiro encontro, quando a jovem está lavando uma galinha no rio, Maria chega a pedir que Wilhelm a leve junto para a Alemanha. Ao longo do filme, ambos vão desenvolvendo o relacionamento, que acaba de modo trágico. Wilhelm acaba se juntando aos muckers, e seu casamento com Maria é celebrado por Jacobina; ambos, no entanto, acabam perecendo durante um ataque, não se sabe se de muckers ou de opositores dos muckers.
Vários outros personagens são creditados na história, mas não é fácil identifica-los, pois muitas vezes seus nomes nem são ditos ao longo do filme.
Bem. OS MUCKER não é um filme fácil de assistir – tem pretensões filosóficas demais, e por isso não consegue atingir o grande público. É um filme brasileiro “de arte”, daqueles que nem os brasileiros natos tem paciência para assistir – e que precisa ser assistido mais de uma vez para ser integralmente compreendido. Por isso não é fácil nem para eu fazer esta resenha. Talvez sejamos nós, espectadores, que nos acostumamos mal ao que o cinema contemporâneo nos trouxe. Não tenho notícias se o filme está disponível em DVD, mas, até o momento em que escrevo, ele está disponível, na íntegra, no YouTube (link: https://www.youtube.com/watch?v=W54QRKsnJN8). A quem quiser se arriscar, fica a recomendação.
Para breve, hei de trazer a vocês, continuando a falar a respeito da Revolta dos Muckers, resenhas do livro Videiras de Cristal, de Luís Antônio de Assis Brasil, e de seu produto derivado, o filme A Paixão de Jacobina. A Revolta dos Muckers, por si mesma, não é um tema histórico fácil. O que seria realmente: um mero conflito conduzido por um bando de fanáticos, ou um movimento messiânico surgido como resposta ao descaso das autoridades? Decidam vocês.

Esta postagem é uma versão revista e alterada do texto publicado anteriormente no blog Estúdio Rafelipe (https://estudiorafelipe.blogspot.com.br). Aproveitem e conheçam.
E não se esqueçam de ler livros de vez em quando: os livros ainda são a melhor fonte histórica disponível, já que o cinema não é 100% comprometido com a realidade.

Até mais!

Mensagem de hoje

Fonte: Arte Amiga

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Seção Resenha de Livros: OS FANÁTICOS DE JACOBINA

Olá.
Aqui é o Rafael Grasel novamente, em nova colaboração para o blog da Biblioteca Pública.
Hoje, vamos outra vez, em texto corrido, falar de livro. Vamos outra vez falar de Fidélis Dalcin Barbosa. Vamos resgatar outra obra do escritor, professor e ex-padre gaúcho. E, ao mesmo tempo, vamos falar de um episódio polêmico e controverso da história do Rio Grande do Sul. Tão polêmico que poucos se dão ao trabalho de lembrar – apesar de seus fatos já terem sido duas vezes adaptados para o cinema.
Well. Hoje então vamos falar de OS FANÁTICOS DE JACOBINA (OS MUCKERS), possivelmente o livro mais curto de Frei Fidélis.

HISTÓRIA EM VERSÃO ECONÔMICA
OS FANÁTICOS DE JACOBINA (OS MUCKERS) teve um caminho diferenciado antes de ser lançado em livro. Começou como uma série em folhetim do jornal Correio Riograndense, de Caxias do Sul, RS, em 1970. Nesse ano, Fidélis Barbosa havia visitado o município de Sapiranga, RS, para escrever uma reportagem sobre o município fundado por imigrantes alemães e conhecido como “Capital das Rosas”, e teve contato com a história da Revolta dos Muckers (1868 – 1874), conflito provocado entre um movimento messiânico de imigrantes alemães e o exército brasileiro. Fidélis Barbosa teve oportunidade, inclusive, de conversar com descendentes de integrantes da seita dos Muckers.
Empolgado, Fidélis Barbosa começou a escrever sobre a Revolta dos Muckers em forma de folhetim para o citado Correio Riograndense. O trabalho contou, como fontes, com trabalhos dos historiadores Ambrósio Schupp, Leopoldo Petry e Klaus Becker (em breve, falaremos do trabalho destes com mais detalhes). E, em 1976, os textos foram compilados em livro, pela editora EST (Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes), de Porto Alegre, RS, então dirigida pelo Frei Rovílio Costa. Mais adiante, na postagem, a capa de edição posterior da mesma obra.
O livro é possivelmente o mais curto, e o de leitura mais rápida do escritor: seus 43 capítulos são breves, e o livro todo tem 56 páginas, sem contar capa. É um “curso dinâmico” sobre o fato histórico em questão.

WILLKOMMEN AUF DEM HÜGEL FERRABRAZ (BEM-VINDOS AO MORRO DO FERRABRAZ)
Bem. A Revolta dos Muckers é o nome dado por convenção a uma série de revoltas ocorridas no Morro do Ferrabraz, em Sapiranga, na época distrito de São Leopoldo, e integrante da zona de imigração alemã do Vale dos Sinos. Ali, reunia-se a seita formada por Jacobina Maurer e seu marido João Jorge Maurer.
Jacobina Mentz, seu nome de solteira, era descendente de um colono alemão chegado ao Brasil em 1824, fundador da primeira capela evangélica da região de Novo Hamburgo. Desde a juventude, a moça, com suspeitas de portar algum problema mental, sofria de desmaios e sono letárgico que chegavam a durar 12 horas. Apesar disso, trabalhava nas lides domésticas e do campo.
Seu marido João Maurer era natural de São Sebastião do Caí. Inicialmente marceneiro e agricultor, quando precisou se mudar para o morro do Ferrabraz, João Maurer começou a trabalhar como curandeiro, tendo o auxílio da esposa. Como naquele tempo o local não dispunha de médicos, foi fácil para João Maurer fazer fama na região.
Como muitos dos colonos alemães da época eram analfabetos, saudosos da terra natal, não dispunham sequer de um padre para ministrar missas e se sentiam abandonados pelo governo brasileiro, dependendo apenas dos frutos de árduo trabalho para sobreviver – some-se a isso, ainda, a situação pela qual o Brasil passava durante a Guerra do Paraguai – foi ainda mais fácil para Jacobina convencê-los de que era uma reencarnação de Jesus Cristo e de sua fama de profetiza, e, assim, montar uma seita messiânica, que prometia uma “nova era” aos seguidores. Jacobina ainda era semialfabetizada e interpretava a Bíblia a seu modo, mas conseguiu convencer muitos colonos a se juntarem à seita – foi fundamental para isso a ajuda do marido João Maurer e de João Jorge Klein, cunhado de Jacobina, que difundiram a nova doutrina. Os seguidores de Jacobina ficaram conhecidos como muckers, que, em alemão, significa fanático, falso santo. Todos eram de origem alemã, entre colonos recém-chegados e descendentes de alemães nascidos no Brasil, e era em alemão que os muckers celebravam seus cultos.
O fato determinante para o prestígio da nova seita foi um “milagre” ocorrido em 19 de maio de 1872, dia de Pentecostes, quando Jacobina, deitada em sua cama, aparentemente desapareceu, deixando apenas as roupas, e tornou a reaparecer, vestida de branco. Os presentes tomaram o suposto fato como milagre, e passaram a seguir Jacobina fervorosamente, apesar de esta passar a ditar leis estranhas aos fieis, como determinar que os membros da seita tirassem os filhos das escolas, parassem de frequentar as igrejas católicas e que os maridos ou esposas muckers se divorciem dos cônjuges que se recusassem a seguir a nova religião. Além disso, ela formou um grupo de doze apóstolos, entre conhecidos e familiares – que muitos dizem que eram, na verdade, seus amantes.
Como muitos seguidores de Jacobina já começaram a se retirar da seita ao se sentirem enganados, a profetiza, sob orientação de seus seguidores, passou a ordenar a perseguição aos “ímpios”, visando batalhas sangrentas.
A primeira tentativa de coibir a seita dos muckers foi um abaixo-assinado entregue ao delegado de polícia de São Leopoldo. Ela foi elaborada por Filipe Sehn, cujo objetivo é tentar tirar o irmão, João Sehn, da seita, e pelo professor Weiss. Pouco depois é que foram enviados homens para o morro do Ferrabraz; inicialmente, prendem João Maurer, que foi levado para Porto Alegre; Jacobina conseguiu ficar no Ferrabraz, sob proteção dos fiéis. Dias depois é que Jacobina é presa, mas precisam levar a mulher, que se encontrava em um de seus acessos de sono letárgico, com colchão e tudo – ela acorda na delegacia de São Leopoldo. Ela também acaba conduzida para Porto Alegre. Enquanto isso, os muckers tentam celebrar a festa de Pentecostes, mas são dispersados por policiais. Os muckers, de muitas maneiras, criam problemas para os policiais.
Pouco depois, o casal Maurer retorna ao Ferrabraz – eles acabam soltos por falta de provas – e são recebidos festivamente pelos membros da seita. Sob orientação de Jacobina, os muckers, sabedores que a polícia continuava de olho na seita, constroem uma “fortaleza” anexa à casa dos Maurer, e adquirem muitas armas para defesa. A polícia faz mais algumas “visitas” ao morro do Ferrabraz, e prendem membros da seita – entre os presos, João Maurer acaba levado novamente, enquanto Jacobina fica solta. Pouco depois, aproveitando a ausência do marido, Jacobina se separa de João Maurer, e se “casa” com João Klein, seguindo sua própria “lei”.
E é nesse ponto que os muckers começam a atacar autoridades e colonos que não abraçaram a seita. O auge da loucura foi quando os muckers começaram a incendiar casas e a matar familiares de opositores – não escaparam nem mulheres e nem crianças, sequer parentes. Entre as vítimas dos muckers, estavam as famílias do ex-seguidor Martinho Kassel, primo de Cristiano Kassel, um dos “doze apóstolos”; a família de Carlos Brenner, cujos filhos são cruelmente assassinados antes da casa ser incendiada; nem mesmo parentes de Jacobina ficaram ilesos. A sanha assassina dos muckers estendeu-se até a picada de Dois Irmãos, hoje cidade.
Em princípio, o Governo Federal não fez nada para coibir a seita, limitando-se apenas a substituir o chefe da Polícia de São Leopoldo – apesar de os colonos terem encaminhado ao Presidente da Província uma petição com mais de duas mil assinaturas pedindo a expulsão dos muckers da região. Os próprios muckers também encaminharam uma embaixada ao Imperador Pedro II pedindo proteção contra a ação da polícia. Nenhuma das partes queixosas foi beneficiada pelas autoridades. Só quando as coisas começaram a sair do controle é que foi organizado um exército para conter o conflito no Ferrabraz.
Foram necessárias três expedições militares, vindas de Porto Alegre, para dar cabo da seita de Jacobina. A primeira, realizada entre 28 de junho e 18 de julho de 1874, resultou na destruição da fortaleza dos muckers e na morte de alguns seguidores, mas sem conseguir prender seus líderes, que refugiaram-se em cabanas perto de uma fonte de água. Essa primeira expedição foi chefiada pelo coronel Genuíno Olímpio Sampaio, nordestino veterano de outras revoltas militares, comandando, entre seus homens, diversos veteranos da Guerra do Paraguai. Mas, em 20 de julho, o coronel Sampaio, que já estava declarando vitória, acaba recebendo um tiro acidental de um de seus soldados, vindo a falecer por falta de tratamento médico. E a expedição do dia seguinte, comandada pelo coronel Augusto César da Silva, acaba malograda pelos muckers. As sucessivas derrotas já estavam mexendo com os ânimos dos militares.
A terceira expedição, comandada pelo capitão Francisco Clementino Santiago Dantas, que substituiu Augusto César, tem melhor resultado: atacam o esconderijo de Jacobina no dia 2 de agosto e conseguem dar cabo de vários líderes da seita – entre estes, Jacobina Maurer. Tal expedição foi possível por conta da traição do mucker Carlos Luppa, que deserta da seita e passa a auxiliar a polícia. Vários muckers sobreviventes são presos, mas, depois, liberados, e se dispersam para outras localidades, como Linha Pirajá, perto de Nova Petrópolis, e Terra dos Bastos, próximo a Lajeado. Os remanescentes da seita são perseguidos nos anos seguintes. João Maurer foi encontrado morto enforcado. E os últimos muckers perecem em 1903.
Esses episódios de violência e messianismo foram determinantes para que, até hoje, a Revolta dos Muckers se tornasse um tabu entre os descendentes dos personagens dessa história. Mas a saga de Jacobina Maurer contribuiu para atrair turistas e historiadores para Sapiranga – até hoje, são locais de visitação: o monumento ao Coronel Sampaio e a cruz que marca o local onde Jacobina pereceu, integrantes do roteiro conhecido como Caminhos de Jacobina – e rendeu filmes e romances.
A primeira obra artística sobre o tema foi o filme Os Muckers (1978), produção teuto-brasileira dirigida pelo brasileiro Jorge Bodanzky e pelo alemão Wolf Gauer, que contava, em seu elenco, com vários descendentes de muckers, e com a atriz Marlize Saueressig como Jacobina. Esse filme ganhou o troféu Kikito de Melhor Atriz do Festival de Cinema de Gramado, RS.
Em 1990, o escritor gaúcho Luís Antônio de Assis Brasil retrata o episódio em seu romance Videiras de Cristal; e, em 2002, o diretor brasileiro Fábio Barreto adapta o romance de Assis Brasil sob o título A Paixão de Jacobina, com a atriz Letícia Spiller interpretando Jacobina Maurer. Os locais que serviram de locação para o filme também integram os Caminhos de Jacobina.

CONTROVÉRSIAS
Alguns historiadores defendem um lado “social” do episódio do Ferrabraz. Tal como foi com a Guerra de Canudos na Bahia, ou com a Guerra do Contestado, em Santa Catarina e Paraná (apesar de esses eventos serem muito posteriores ao fato em questão) a Revolta dos Muckers, na interpretação de historiadores marxistas, teria sido uma resposta dos colonos ao descaso do governo e ao autoritarismo das forças policiais, levando-os a se juntar em torno de líderes messiânicos, como foi, logo, com Jacobina Maurer.
Como bom católico, e portando se opondo a maneiras “alternativas” de louvar a Deus que não as religiões oficiais, Fidélis Barbosa, em OS FANÁTICOS DE JACOBINA, retrata os muckers, e principalmente Jacobina, como vilões, fanáticos e perversos. Como não se sensibilizar, por exemplo, com as cenas dos ataques dos muckers às casas de opositores, matando seus familiares a tiros, coronhadas ou carbonizando as vítimas junto com as casas?
Narrando a história em um estilo compreensível ao leitor em geral, de forma linear, Fidélis Barbosa, conduz a história com inserções de diálogos e didatismo, sem o uso de análise psicológica dos personagens – ou melhor, narrando a história diretamente, sem perder muito tempo com explicações. Por isso o romance é bem curto, e praticamente é um “curso” sobre a Revolta dos Muckers. Fidélis Barbosa escreveu como um professor, citando à larga nomes dos envolvidos, datas e ações. É possível, graças à diagramação do livro, praticamente saber onde começam e terminam os capítulos publicados no Correio Vacariense, apesar de tais capítulos terem sido divididos em subtítulos, resultando em 43 capítulos.
Mas dá a entender que a Revolta dos Muckers foi fruto dos delírios messiânicos de uma mulher doente. Talvez seja. Mas, como historiador que sou, pretendo, em breve, trazer aos leitores alguns livros mais com a “segunda versão” dos fatos. Aguardem.
Facilmente encontrável em bibliotecas, OS FANÁTICOS DE JACOBINA reafirma o lado historiador de Fidélis Barbosa. Não tão extenso como seus livros posteriores onde conta histórias de cidades, mas vale uma olhada.

Esta postagem é uma versão revista e ampliada do texto publicado anteriormente no blog Estúdio Rafelipe (https://estudiorafelipe.blogspot.com.br/). Aproveitem e conheçam.
Caso haja alguma dificuldade para encontrar algum dos livros resenhados aqui no blog, peça orientação às bibliotecárias da Biblioteca Pública Municipal Theobaldo Paim Borges. Mas não deixem de visitar e prestigiar o local.
Em breve, uma nova resenha de livros aos leitores.

Até mais!

Biografia de Agatha Christie



Agatha Christie (1890-1976) foi uma escritora inglesa. "Hercule Poirot" é um detetive belga que aparece em 33 obras da autora. Agatha foi a maior escritora policial de todos os tempos. Escreveu 93 livros e 17 peças teatrais.
Agatha Christie (1890-1976) nasceu em Torquay, condado de Devonshiri, Inglaterra, no dia 15 de setembro de 1890. Filha do americano FredericK Miller e da inglesa Clara. De família rica, Agatha estudou em casa, com professores particulares, aprendeu piano e canto. Passava a maior parte do tempo escrevendo poemas e contos. Em 1914, casa-se com o piloto inglês Archibald Christie, de quem adota o sobrenome.
Em 1917, desafiada pela irmã Madge a criar uma trama policial, escreve seu primeiro livro, "O Misterioso Caso de Styles", em que o detetive belga, Hercule Poirot, aparece pela primeira vez. O livro só foi publicado em 1920. Escreveu outros livros, mas foi em 1926, com "O Assassinato de Roger Ackroyd", que ficou famosa. Depois que seu marido revelou que queria se separar, Agatha desaparece e só é encontrada depois de 11 dias. Algumas pessoas afirmavam que o desaparecimento foi uma trama para vender mais livros.
Em 1930, já divorciada, casa-se com o arqueólogo Max Mallowan e com ele viaja pelo Oriente, onde se inspira para escrever vários livros entre eles "Assassinato no Expresso do Oriente" (1934), "Morte na Mesopotâmia" (1936), "Morte no Nilo" (1937) e "Aventura em Bagdá" (1951).
Seu personagem mais constante, o detetive Hercule Poirot, aparece em 33 livros. Outro personagem conhecido é a curiosa Miss Marple, inspirada em sua avó. A peça "A Ratoeira" (1951) é a mais popular de Agatha Christie, encenada mais de 13 mil vezes na Inglaterra. Alguns de seus livros foram adaptados para o cinema, televisão e teatro.
Agatha Mary Clarissa Miller faleceu em Wallingford, Inglaterra, de pneumonia, no dia 12 de janeiro de 1976.

Fonte do texto: Ebiografia
Fonte da foto: Mil e uma noites

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

A Garota do Penhasco - Lucinda Riley

Sugestão de leitura:

'A Garota do Penhasco' é um romance que enreda o leitor através de vários fios: a história de Grania Ryan e sua querida Aurora Devonshire, a garota do penhasco, nos fala sobre mudança de vida.
A história das famílias Ryan e Lisle é um lindo conto sobre um século de mal-entendidos e rancor entre inimigos que se acreditam enganados por falcatruas financeiras.
O caso de amor entre Grania Ryan e Lawrence Lisle comove por sua delicadeza e força vertiginosa que culmina em imensa tristeza.
Mas, sobretudo, 'A Garota do Penhasco' é um livro que mostra como é possível encontrar uma finalidade, um propósito, quando todas as esperanças parecem perdidas.