quinta-feira, 6 de abril de 2017
quinta-feira, 16 de março de 2017
Seção Resenha de Cinema: CONCERTO CAMPESTRE
Olá.
Aqui
é o Rafael novamente, em mais uma colaboração seguida para o blog da Biblioteca
Pública. E hoje, com a Seção Resenha de Cinema – filmes baseados em livros.
Na
última postagem, tratei do belíssimo romance Concerto Campestre, de Luiz Antonio de Assis Brasil. Um libreto de
ópera sul-riograndense, de leitura rápida e proveitosa.
Pois
hoje, vou tratar de seu produto derivado: CONCERTO CAMPESTRE – o filme. Tão
belo quanto o livro – até certo ponto.
ASPECTOS TÉCNICOS
Bem.
CONCERTO CAMPESTRE, o livro, foi publicado em 1997; no ano seguinte, o cineasta
Henrique de Freitas Lima, percebendo o potencial do romance para uma adaptação
cinematográfica, inicia o projeto para a dita adaptação. O projeto correu de
1998 a 2003, e CONCERTO CAMPESTRE, o filme, chega aos cinemas em 2005. Duração
de 100 minutos. Com direção de Henrique de Freitas Lima, com assistência de
Nestor Monastério. O roteiro da adaptação é de José Mandel Fernandez, Pedro
Zimmermann e Tabajara Ruas, com produção da Empresa Cinematográfica Pampeana.
CONCERTO
CAMPESTRE é a segunda adaptação de um romance de Luiz Antonio de Assis Brasil
para o cinema – a primeira foi A Paixão
de Jacobina, de 2002, criticada adaptação de Fábio Barreto do romance Videiras de Cristal (1990). Vamos
lembrar que Assis Brasil já foi vertido cinco vezes para o cinema: além de Videiras de Cristal e Concerto Campestre, tivemos as
adaptações de Um Quarto de Légua em
Quadro (1976), sob o nome Diário de
Um Novo Mundo (direção de Paulo Nascimento, 2005); Manhã Transfigurada (1982) rendeu um filme homônimo (dirigido por
Sérgio de Assis Brasil, 2008); e Ensaios
Íntimos e Imperfeitos (2008) é adaptado para uma série de mini
documentários dirigidos por Douglas Machado, em 2016, com atuação do próprio
Assis Brasil. Esses documentários podem ser assistidos no website do autor.
VOLTANDO AO FILME...
CONCERTO
CAMPESTRE tem, a seu favor: a boa reconstituição histórica (o filme se passa no
ano de 1860, no contexto da era das charqueadas no Rio Grande do Sul), a
estonteante cenografia e a enorme fidelidade ao romance. Freitas Lima e seus
cúmplices tomaram apenas algumas liberdades e fizeram algumas mudanças em
detalhes do enredo, mas a história do livro, em si, não apresenta grandes
mudanças – os fatos principais da história, do começo ao fim, foram mantidos.
Alguns acréscimos, de fatos e personagens novos, enriquecem o enredo.
Uma
das preocupações de Freitas Lima e equipe foi manter o principal motor da
trama, a música. As músicas de fundo se compõem de peças conhecidas e/ou pouco
conhecidas de música clássica, interpretadas pela orquestra regida por Jean
Potiguara; e, assim, o filme transmite bem a proposta de retratar a época em
que se passa. Outra preocupação da equipe do filme foi expressar em imagens o
tom bucólico do romance, passado quase todo em uma fazenda do interior do Rio
Grande do Sul (então chamado Província de São Pedro). Isso fica explícito logo
na cena de abertura, com a sequência mostrando o trabalho numa charqueada –
vaqueiros manejando o gado nos campos e nos cercados, carneando bois, e
escravos (na época, 1860, ainda imperava a escravidão nas atividades produtivas
brasileiras) tratando a carne, colocando-a para secar ao sol, livrando-se dos
restos dos bois, e o sangue das reses correndo através de canaletas até um poço
próximo.
A
charqueada pertence ao rude Major Eleutério de Fontes (Antonio Abujamra). Um
dia, ele escuta, durante um passeio pela propriedade, dois índios missioneiros
e nômades tocando música sob uma árvore; o Major gosta do que ouve, e contrata
os índios para sua fazenda, para tocar para ele. O Major reside com sua família
na fazenda charqueadora: entre os membros, a severa esposa, Dona Brígida (Araci
Esteves, que, entre outros trabalhos, participou de outros dois filmes ambientados
no Rio Grande do Sul, Anahy de las
Misiones [direção de Sérgio Silva, 1997] e Netto Perde Sua Alma [direção de Tabajara Ruas e Beto Souza, 2001]),
que acha o gosto do Major pela música uma perda de tempo, e a filha, Clara
Victoria (Samara Felippo), petulante e com arroubos de rebeldia.
A
notícia se espalha, e logo outros músicos chegam para trabalhar na estância, em
boa parte vagabundos sem ter para onde ir. O Major confidencia com o Vigário da
Vila de São Vicente (Miguel Ramos) a possibilidade de montar uma orquestra; e o
Vigário recomenda o aventureiro Miguel, vulgo Maestro (Leonardo Vieira) para
organizar os músicos em uma orquestra decente.
O
sedutor Maestro aceita a incumbência da organização da orquestra, mas logo vê
que as coisas não são tão simples como a princípio imaginava. O Major recomenda
ao Maestro “severidade e virtude”, traduzidos como “trabalho e disciplina”. O
estancieiro manda buscar, inclusive, instrumentos para a organização da
orquestra, batizada de Orquestra Santa Cecília, por sugestão do Vigário.
O
Maestro trabalha com afinco e alguma severidade para organizar o grupo de
músicos de talento mediano (entre os músicos está o ator e violinista Hique
Gomes, do espetáculo humorístico Tangos e
Tragédias, inclusive protagonizando uma cena cômica!). Enquanto isso, seus
passos são observados tanto pelo Major quanto pela mocinha Clara Victoria, que
se interessa pela figura do mulato. Mas, este, a princípio, vive às turras com
a moça – em uma cena, implica com Clara Victoria quando ela resolve arear
panelas, junto com as criadas, perto do galpão onde os músicos ensaiam.
O
Maestro, enquanto escreve pautas e dedilha seu bandolim nas horas de folga, e
enquanto ensaia com a orquestra durante horas, observa o dia-a-dia da
charqueada. Vê que, apesar de demonstrar um pendor para a modernidade com a sua
orquestra, o Major mantém códigos morais conservadores para com as pessoas que
o cercam: é severo com os escravos e familiares. Em uma cena, o Maestro usa
como exemplo de castigo por indisciplina, aos músicos, um escravo que foi morto
por empregados da fazenda durante uma tentativa de fuga do cativeiro. Em outra,
o Major pune, amarrando ao tronco e dando-lhes chibatadas, um escravo rebelde,
João Congo (Sirmar Antunes). Dona Brígida, por sua vez, vê na orquestra um
sinal de loucura do marido, enquanto se preocupa com um bom casamento para
Clara Victoria – tenta empurrar a filha para se casar com Silvestre Pimentel
(Alexandre Paternost, que esteve no elenco de A Paixão de Jacobina como João Maurer, o marido da protagonista), o
herdeiro de uma estância vizinha. Entretanto, a moça, embora obedeça a mãe,
demonstra sinais de rebeldia, com suas respostas petulantes e não
correspondendo à afeição do bonito, porém tedioso, Silvestre. Fica evidente,
inclusive, que o Major e Dona Brígida não se dão bem um com o outro – eles
partilham apenas dos códigos morais conservadores e algo tacanhos. Dona Brígida
acaba ganhando ares de vilania.
A
orquestra, já ensaiando na capela da fazenda, só começa a ir para a frente com
a entrada do erudito Antônio de Lima, o Rossini (Roberto Birindelli), que se
torna grande amigo e confidente do Maestro.
Mas
não sem algum conflito: o Maestro tem um desentendimento com o Major porque
resolve convocar o escravo João Congo para tocar os tambores, depois de
presenciá-lo, na senzala, batucando durante o velório ao modo africano do
escravo morto. A contragosto, o Major concorda em colocar o rebelde na
orquestra. E, dentro de breve, a Orquestra Santa Cecília consegue encontrar a
harmonia.
O
Major convoca pessoas dos arredores para assistir a primeira apresentação da
orquestra, que se torna um sucesso. E, logo, a Orquestra Santa Cecília sai em
turnê pela Província. O Major até constrói um palco ao ar livre em um terreno
da estância para futuras apresentações da Orquestra anta Cecília.
Enquanto
isso, começa a se desenvolver a relação amorosa entre Clara Victoria e o
Maestro. Aos poucos, o mulato se apaixona pela mocinha – o Maestro, a pedido da
moça, ensina-a a ler e escrever. E daí, desenvolve-se o romance. Clara Victoria
engravida do músico, e consegue esconder o fato o quanto pode, enquanto
continua obrigada a se encontrar com Silvestre Pimentel, que está, sim,
interessado na mocinha. Apenas Rossini, comparando a situação a uma ópera, sabe
do romance proibido. Mas, logo, o Vigário acaba descobrindo, mediante confissão
da mocinha, e tenta, nesse ínterim, adiantar o casamento entre Clara Victoria e
Silvestre Pimentel, o que desperta desconfiança por parte do Major.
Entretanto,
logo que os pais descobrem que a filha engravida, tudo se encaminha para a
tragédia: Dona Brígida e o Major acreditam que o responsável pela gravidez foi
Silvestre Pimentel, e o estancieiro tenta matar o rapaz a tiros, conseguindo
apenas, entretanto, aleijá-lo. Clara Victoria acaba expulsa de casa, levada a
viver em uma casa abandonada na beira de um arroio, dentro de uma mata, tendo
apenas o capataz, Salvador (Pedro Machado) e a criada Sinhá Gonçalves (Naiara
Harry) para se preocupar com seu destino. Na casa, Clara Victoria tem sua
filha, que é levada para ser amamentada por uma mulher da vila.
O
Major, que ainda proíbe que se fale da filha em casa, ainda despede a Orquestra
Santa Cecília. O Maestro sofre muito, mesmo consolado por Rossini, e ainda é
repreendido pelo Vigário. E o Major, sem sua orquestra, começa a enlouquecer,
sempre indo ao palco construído, ouvindo orquestras imaginárias. Dona Brígida
também começa a surtar com a loucura que toma conta de seu lar. Aí, a Orquestra
Santa Cecília resolve retornar para a estância – a ideia do maestro é
confrontar o Major e tentar convencê-lo a reconsiderar o castigo dado a Clara
Victoria. Aí, um fato fantástico ocorre para o desfecho da trama, enquanto
Guará (Lori Nelson), empregado de Silvestre Pimentel, se encaminha para a estância
para vingar o sofrimento do patrão...
Talvez
a parte mais fraca de todo o filme seja a sequência final – a cena da
tempestade que cai sobre a fazenda, e do pé-de-vento que cai sobre o poço de
sangue bovino, fazendo chover sangue sobre as pessoas que estão assistindo a
apresentação final da orquestra. A tempestade, produzida de maneira digital,
não ficou convincente, apesar dos esforços da equipe de efeitos especiais,
coordenada por Paulo Crespo e Hugo Werle.
Mas
o restante do filme vale a assistida. Houve esmero na reconstituição histórica.
O enredo acabou enriquecido com os detalhes acrescentados em relação ao livro –
por exemplo: o Maestro, no livro, não tem seu nome verdadeiro revelado: é só no
filme que ele se chama Miguel. E o personagem João Congo não existe no livro –
sua inclusão no roteiro foi uma boa aquisição, aliás, no livro, Assis Brasil
não inclui escravos entre os personagens centrais. O contexto pelo qual o
Maestro e Rossini se conhecem também é diferente entre o livro e o filme – o
Maestro encontra Rossini durante uma viagem para Porto Alegre, no livro,
enquanto que, no filme, Rossini se apresenta na estância, e aparece durante o
primeiro ensaio da orquestra na capela. Do personagem Vigário, foi retirada
dele sua característica de consultar constantemente o termômetro, mantendo seu
caráter conservador. E nem Guará existe no livro – ele, no filme, dá um fim
diferente do constante no livro a Silvestre Pimentel e ao Major... Oh: a tapera
do boqueirão, para onde Clara Victoria é levada, é apresentada no início do
livro como um local mal-assombrado, de onde escravos do Major vão colher uvas
muito apreciadas; tal característica, a das “uvas do fantasma”, é retirada do
roteiro do filme, e a tapera é apresentada bem depois. Ah: a turnê da Orquestra
Santa Cecília pela província, se bem me lembro, também não consta no livro.
Mas,
no mais, o filme é bem fiel ao livro. Mantém toda a estrutura de sua história,
sem tirar demais, sem acrescentar demais. E as interpretações dos personagens
são excelentes. O resultado ficou bem melhor que A Paixão de Jacobina, que pouco trouxe do romance original.
Ressalta bem o bucolismo proposto do Assis Brasil, e é excelente para exibição
em escolas, como retrato de uma época – seus 100 minutos passam voando. Algumas
peças de música clássica que fazem parte da trilha sonora são reconhecíveis,
principalmente para quem cresceu apreciando esse tipo de música através dos
desenhos animados.
Ainda
que o cinema nacional seja algo para se ver com reservas, CONCERTO CAMPESTRE
vale uma sessão. Com os típicos elementos de uma novela. E já que temos atores
globais no elenco, isso fica evidente.
Ah:
o filme completo já pode ser encontrado no YouTube, até o momento em que
escrevo (assista aqui: https://www.youtube.com/watch?v=X-dUBEMCS9k), embora seja fácil acha-lo em DVD nas locadoras. Não duvido que também
já esteja disponível nos sites de streaming na internet.
Este
texto é uma versão revista e com alterações do texto publicado anteriormente no
blog Estúdio Rafelipe (https://estudiorafelipe.blogspot.com.br/).
Aproveitem e conheçam.
Assistam
ao filme, mas também não deixem de ler o livro! Este também está disponível na
Biblioteca Pública Theobaldo Paim Borges!
Em
breve, nova resenha. Tanto de livro como de filme.
Até
mais!
quarta-feira, 15 de março de 2017
Seção Resenha de Livros: CONCERTO CAMPESTRE
Olá.
Aqui
é o Rafael novamente, em nova colaboração para o blog da Biblioteca Pública.
Faz tempo que não passo aos leitores outra resenha de livros, então, vamos dar
uma movimentada neste blog.
Vamos
falar, hoje, de livro. De romance. De romance de fundo histórico ambientado no
Rio Grande do Sul. Vamos trazer de novo aos holofotes o escritor Luiz Antonio
de Assis Brasil, um especialista no gênero.
Vamos
hoje falar de CONCERTO CAMPESTRE.
O LIVRO
CONCERTO
CAMPESTRE, hoje o livro mais lembrado de Assis Brasil – muito por conta da
adaptação do mesmo para cinema – foi publicado pela primeira vez em 1997, pela
editora L&PM, atual editora das obras do escritor. A capa acima é da
primeira edição, com ilustração do cartunista Caulos – e com essa ilustração
permanece nas edições posteriores.
O
romance, ao contrário dos dois outros que resenhei aqui no blog – Cães da Província e Videiras de Cristal – não se serve de fatos reais para a construção
ficcional, ou melhor, só um pouco. CONCERTO CAMPESTRE se utiliza de um contexto
histórico conhecido pela historiografia e de uma história lendária para a
condução do enredo, além de carregar um pouco da experiência de vida do autor –
o motor do enredo é a música clássica, e Luiz Antonio de Assis Brasil já havia
sido músico, tendo tocado na Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA) como
violoncelista, nos anos 1970, antes de abraçar a literatura.
Outro
motor do enredo ele relata em uma nota no posfácio da obra:
“A história da moça
abandonada no boqueirão me foi contada por uma amiga, a escritora Hilda Simões
Lopes, e aconteceu no século passado [século XIX], nos campos de sua família.
É, portanto, uma ‘história real’, o que lhe dá certa nota picante; mas aqui,
como em todas as realidades, a
fantasia ocupa o lugar do trivial e do desconhecido – e isso é apenas uma
homenagem à Literatura. (L.A. de A.B.)” (in: Concerto Campestre – L&PM, 1997, p. 175).
CONCERTO
CAMPESTRE ganhou ainda mais notoriedade após a adaptação para cinema, dirigida
por Henrique de Freitas Lima em 2004. Deste falamos depois.
A
narrativa de CONCERTO CAMPESTRE é conduzida fazendo uso do insólito, do
inesperado, do suspense e do bucolismo (forma de poesia que valoriza a vida
pastoril), conduzido suavemente como uma valsa ecoando na solidão do pampa, num
enredo que envolve preconceitos, paixões, violência e termina num final
surpreendente. Além disso, é um livro que se lê em uma só sentada: a primeira
edição tem 176 páginas, sem contar capa, e só sete capítulos. Só o que pode assustar
o leitor são os parágrafos contínuos, intermináveis, e quase sem travessões para
indicar os diálogos. Fora isso, o livro de narrativa não-linear, com idas e
vindas constantes de um ponto do tempo a outro, ritmo de uma ópera e revelações
surpreendentes ao fim de cada capítulo, é agradável.
O ENREDO DA ÓPERA
A
história de CONCERTO CAMPESTRE se passa na segunda metade do século XIX, no
interior do Rio Grande do Sul, na vila de São Vicente, à beira do Rio Santa
Maria. Ali, está a estância charqueadora (fazenda de criação de gado e produção
de carne-seca para comércio) pertencente ao conservador e autoritário Major
Antônio Eleutério Fontes, homem de passado rude que atuara na Guerra dos
Farrapos. Ali, ele vive com a família, composta pela esposa, a ainda mais
conservadora D. Brígida, três filhos homens, dois netos e uma filha temporã,
Clara Vitória.
Apesar
do conservadorismo e dos códigos morais hoje tacanhos, que ele procura
preservar a todo custo, o Major Eleutério cultiva uma excentricidade, que
podemos tomar como um sinal de modernidade, naquele local ermo e praticamente
longe de outros sinais de civilização: uma orquestra particular, a Lira Santa
Cecília.
Começou
quando o Major encontrou dois índios missioneiros e andarilhos tocando seus
instrumentos, e, após uma desconfiança inicial, praticamente gostou do que viu
e ouviu, contratando os dois índios para trabalhar na estância, e, claro, tocar
de vez em quando para ele. Naquela época, música, de acordo com a moral dos
estancieiros, era coisa malvista, coisa de gente de má vida – bêbados e
prostitutas – e aceitável apenas dentro das igrejas, por isso D. Brígida,
principalmente, símbolo da mentalidade arcaica que se contrapõe ao sinal de
modernidade do Major, desaprova a atitude inicial do marido, e o que vem
depois...
A
notícia de que o Major estava admitindo músicos em sua estância se espalha, e
logo outros músicos procuram trabalho na estância. A coisa, no entanto, foge um
pouco do controle, pois a maioria desses músicos era de andarilhos e vagabundos
– e os índios foram embora, ou pela natureza nômade ou por causa do preconceito
dos outros músicos – e então, por sugestão do Vigário da Paróquia de São
Vicente – um padre dividido entre o conservadorismo e a modernidade, já que,
apesar de se opor às relações amorosas “modernas”, costuma consultar um
termômetro para avaliar o tempo – o Major resolve organizar os músicos em uma
orquestra.
Para
colocar ordem nos músicos da fazenda, o Vigário recomenda ao Major o musico
conhecido apenas como Maestro. O mulato, nascido em Minas Gerais, teve uma vida
de verdadeiras aventuras, entre empregos como músico em igrejas e no exército,
e convivendo com gente “de má fama”, sempre acompanhado de seu bandolim, que
ele dedilha nas horas de folga. O Maestro, pago para se dedicar exclusivamente
à orquestra, e que ganhou inclusive seu próprio quarto, coloca ordem na casa:
organiza os músicos em uma orquestra respeitável, com instrumentos de cordas e
metais (que o próprio Major importa), inclusive trazendo músicos de Porto
Alegre. Entre eles, o rabequista veterano conhecido como Rossini, por conta de
seu gosto por ópera, talentoso e erudito, e que se torna o grande amigo e
confidente do Maestro.
Mas
o Maestro não é necessariamente um modelo de bom comportamento: apesar das
recomendações do vigário e do Major, em uma noite, o mulato seduz uma
cozinheira da estância. O Maestro, após ser denunciado, leva uma reprimenda do
Major, que, por via das dúvidas, despede a cozinheira.
A
Lira Santa Cecília logo se organiza, tocando melodias suaves e agradáveis em
festas, velórios ou apenas para o deleite do Major, chamando a atenção
inclusive dos amigos dele. Um deles faz questão que a Lira toque em seu
velório, como um último desejo. Entre um ensaio e outro, o Maestro acaba
chamando a atenção da adolescente Clara Vitória, então na flor da virgindade e
da pureza, e em idade de casar – tanto que, por imposição da mãe, passa boa
parte do tempo confeccionando seu enxoval, embora seu real desejo seja o de
aprender a ler e escrever.
A
moça se apaixona pelo Maestro, mas inicialmente o músico a rechaça; mas, pouco
a pouco, o Maestro começa a corresponder à afeição da garota. E ambos começam a
viver uma relação amorosa proibida e secreta. O Maestro chega a dedicar a Clara
Vitória uma composição. E a garota, entre um encontro furtivo e outro no quarto
do Maestro, acaba engravidando do mulato.
A
gravidez ficou escondida o quanto foi possível. Enquanto isso, D. Brígida, que
acha a organização da orquestra uma perda de tempo e preocupada com a posição
social da família, tenta arranjar o casamento de Clara Vitória com Silvestre
Pimentel, sobrinho e herdeiro do Barão de Três Rios, dono de uma estância
vizinha. Vive arranjando encontros entre os dois, sem desconfiar que a filha
ama outro, claro. Enquanto isso, Silvestre Pimentel vai adiando a data do
casamento – nesse meio tempo, seu tio falece.
Mas
não demora para que D. Brígida descubra a gravidez da filha. O primeiro a saber
do assunto, mediante confissão, foi o Vigário. Felizmente, quando a gravidez de
Clara Vitória vem à tona, a família imagina que o responsável foi Silvestre
Pimentel, já que, em uma ocasião, os dois haviam saído sozinhos ao pomar, mas
sob os olhares de uma criada. Mas, infelizmente, os inocentes acabam pagando o
pato: o Major tenta matar Silvestre Pimentel, mas fracassa. Já quanto a Clara
Vitória, leva bofetadas da mãe e o pai acaba a renegando, condenando-a a viver
em uma casa abandonada dentro do mato. Essa casa era tida como mal-assombrada,
e no local então só entravam alguns escravos para colher cachos de uvas de uma
parreira próxima. O acesso à floresta é cortado e vigiado. Em outro acesso de
loucura, o Major despede a Lira Santa Cecília, e o Maestro, Rossini e os outros
músicos vão para Porto Alegre.
Com
o passar do tempo, todos passam por uma degradação moral. O Major vai perdendo
a razão, e sua estância, agora administrada pelos filhos mais velhos, passa a
ser evitada por todos, inclusive pelo Vigário, depois do que o Major fez a
Clara Vitória; a filha, por sua vez, começa a se acostumar com a solidão do
lugar ermo, cujo contato com o mundo passa a ser através do capataz da fazenda,
que lhe traz comida dia sim dia não, e da parteira – Clara Vitória tem sua
filha ali na tapera, e a menina é levada para ser amamentada por uma ama da
estância; e o Maestro, por sua vez, vai padecendo de saudades de sua amada, e
leva uma vida indisciplinada em seu novo emprego. Está decidido a voltar para a
estância e resgatar Clara Vitória.
Afinal,
depois de algum tempo, ele consegue realizar seu intento: levando a Lira Santa
Cecília, o Maestro retorna, e é recebido com alegria pelo Major, que solicita
uma apresentação. Porém, como nenhum dos amigos do Major quer comparecer ao
concerto, o homem obriga a criadagem a assistir a apresentação. E os
acontecimentos que se seguem são os mais insólitos, envolvendo uma morte e uma
inesperada chuva de sangue, conduzindo ao final de uma ópera... com final
trágico porém allegro.
Luiz
Antonio de Assis Brasil conduz uma ópera sul-riograndense, com influência das
poesias bucólicas do poeta romano Virgílio e traduzindo em palavras os
sentimentos de quem está preso ao campo em todos os sentidos: desde o espaço
geográfico até as convicções morais. Conflito entre modernidade e
conservadorismo, até mesmo na forma de amar. A narrativa, apesar da linguagem
erudita, prende o leitor até o fim, depois que ele se acostuma com a forma do
texto.
CONCERTO
CAMPESTRE pode ser encontrado com facilidade nas bibliotecas e em algumas
livrarias. Disponível também nos formatos pocket e e-book.
Esta
postagem é uma versão revista e com alterações do texto publicado anteriormente
no blog Estúdio Rafelipe (https://estudiorafelipe.blogspot.com.br/).
Aproveitem e conheçam.
Não
deixem de visitar a Biblioteca Municipal Theobaldo Paim Borges! Leiam o livro,
e depois assistam ao filme!
Falando
nisso, na próxima postagem: CONCERTO CAMPESTRE, o filme.
Até
mais!
quarta-feira, 8 de março de 2017
Três ilustrações para o Dia da Mulher
Olá.
Aqui é o Rafael novamente.
Enquanto escrevo, ainda é o Dia Internacional da Mulher - e, como forma de homenagem, só tenho para deixar, aqui, três ilustrações antigas e alusivas à data. Para serem usadas como cartão de felicitações.
Quem acessar o blog Estúdio Rafelipe hoje (https://estudiorafelipe.blogspot.com.br/) terá uma surpresa especial... Confiram!
Até mais!
Aqui é o Rafael novamente.
Enquanto escrevo, ainda é o Dia Internacional da Mulher - e, como forma de homenagem, só tenho para deixar, aqui, três ilustrações antigas e alusivas à data. Para serem usadas como cartão de felicitações.
Quem acessar o blog Estúdio Rafelipe hoje (https://estudiorafelipe.blogspot.com.br/) terá uma surpresa especial... Confiram!
Até mais!
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